Maximiliano Kolbe, o santo de óculos no coração do maior bairro da capital alagoana

Benedito Bentes foi a primeira comunidade no país a ter o santo polonês como padroeiro

Marcos Filipe Sousa – Pascom Arquidiocesana

Fiéis na inauguração da igreja (Foto: Arquivo da Cúria Metropolitana)

“Um santo de óculos?”. Foi a indagação da senhora Maria Viana há 36 anos durante uma conversa com Dom Otávio Aguiar após uma das missas celebradas no recém-inaugurado, Residencial Benedito Bentes I, na parte alta de Maceió. O questionamento surgiu quando em suas mãos foi entregue a foto de São Maximiliano Kolbe, frei polonês, mártir na Segunda Guerra Mundial.

Esse relato e tantos outros estão no livro de tombo da paróquia, escrito pelo próprio bispo, na época, auxiliar na Arquidiocese de Maceió. Foi Dom Otávio que trouxe a devoção para terras maceioenses. O que ele não imaginaria é que Maximiliano se tornaria o protetor do maior bairro da capital alagoana.

“Foi sugerido ao povo a escolha do padroeiro do conjunto, sugerindo o nome de S. Maximiliano Kolbe, há pouco tempo canonizado pelo Santo Padre, o Papa João Paulo II, cuja vida foi objeto de duas pregações. É que Dom Otávio  tomara o propósito de construir uma igreja em honra do santo polonês. A vida de São Maximiliano empolgou, desde logo, o povo presente aos atos litúrgicos e as diversas pessoas foram distribuídas biografias de S. Maximiliano para melhor conhecimento de suas virtudes e santidade pessoais”, escreveu o bispo na primeira página do livro.

Maria Viana lembra bem dessa conversa: “Ele chegou para mim e disse que já sabia quem seria o padroeiro. Então me deu o livrinho e disse que era São Maximiliano Kolbe. Eu nunca tinha ouvido falar. Mas Dom Otávio disse que eu iria gostar, amar. Quando li a história me apaixonei”.

Maria Viana lembra do dia que foi apresentada ao padroeiro (Foto: Reprodução)

Isso ocorreu em 1986 e a comunidade se preparou durante um ano para comemorar a primeira festa de seu padroeiro. Uma imagem foi encomendada, mas ainda faltava algo. Todo santo tem um hino, qual seria o do frei Maximiliano? Dom Otávio contou com a ajuda de um amigo, Dom Fernando Iório, na época bispo da Diocese de Palmeira dos Índios, e inspirados na vida do santo, escreveram a letra:

“Maximiliano Kolbe, santo amigo. De amor ao próximo exemplo, raro e forte. Deste a vida o mártir para salvar da morte a quem sofria na prisão contigo”.

A senhora, a única remanescente do primeiro coral, relatou que o bispo juntava o povo após as celebrações e ensinava parte a parte da música. “Ele ensinou a comunidade. Pena que não foi gravado”.

Uma igreja para o santo polonês

O residencial crescia rapidamente e o bispo via a necessidade da construção de um templo, não havia mais condições de celebrar as missas na escola estadual que havia no local.

Dom Otávio se dirigiu a Companhia de Habitação Popular de Alagoas (Cohab), órgão estadual responsável pela urbanização da cidade, e apresentando a realidade, conseguiu o terreno e no dia 17 de maio de 1988 foi lavrada a escritura e as terras escolhidas passaram a ser propriedade da Igreja.

No dia 04 de outubro, memória litúrgica de São Francisco de Assis, iniciou a construção, como nos relatou Fátima Lima, uma das pessoas que estava nesta noite levando o jantar para os homens que ajudavam a limpar e cercar o local.

Dona Fátima estava na limpeza do terreno (Foto: Reprodução)

“Eu recebi o convite de Dom Otávio para ajudar e começamos limpando o terreno, tinha muito mato. Saímos aproximadamente perto das 23h. Depois iniciou a batalha. O material foi chegando, ele ligava para os empresários que enviavam, e assim foi envolvendo o restante da comunidade. Depois ele sentiu a necessidade de fazer uma casinha, e colocou o pedreiro para morar e vigiar o local, porque estavam furtando material”, disse.

Onze meses depois, no dia 24 de setembro de 1989 era inaugurada a igreja matriz. O evento contou com a presença do arcebispo metropolitano da época, Dom Edvaldo Amaral, e diversas autoridades eclesiais e públicas, como relatado no livro.

As festividades iniciaram às 8h30 com uma procissão saindo da escola onde ocorriam as missas até a igreja matriz com alunos dos colégios particulares e públicos do Benedito Bentes. “Tudo decorreu em clima de piedade e alegria”, escreveu Dom Otávio.

A comunidade se torna oficialmente paróquia

A região em torno do Benedito Bentes I começava a crescer e Dom Otávio viu a necessidade da criação da paróquia com o objetivo de prestar uma melhor assistência aos moradores, e por isso, foi até Dom Edvaldo solicitar a sua implantação.

Quis a graça divina que o ano fosse 1991, quando se comemorava os 50 anos do martírio do frei Maximiliano; e uma festa foi preparada pela comunidade iniciando no dia 14 de agosto, memória litúrgica do santo.

Em 18 de agosto, os moradores do conjunto acordaram cedo, já que às 6h da manhã começava a programação do dia tão aguardado, com uma salva de tiros. O arcebispo chegou às 8h30 e meia hora depois iniciava a missa que criara a primeira paróquia no Brasil dedicada a São Maximiliano Kolbe, ou ao “Santo de Óculos”, como ficou carinhosamente conhecido pelos moradores e pela Dona Maria Viana.

Quem conhece a sua história se apaixona

O atual administrador da paróquia, Padre Petrúcio Ramires, também era um dos que não conheciam a história do santo polonês, mas assim como os moradores do Benedito Bentes I, que lá em 1986 se apaixonaram pela vida de São Maximiliano, ele também se tornaria um devoto.

“Quando cheguei à paróquia eu não conhecia nada. Não sabia quem era a figura de São Maximiliano Kolbe. Foi Dom Edvaldo que me chamou para ser administrador”, brincou.

São Maximiliano Kolbe é padroeiro do maior bairro de Maceió (Foto: Pascom SMK)

No decorrer das semanas, o padre foi ouvindo dos paroquianos e lendo sobre a vida do santo que no dia 14 de agosto de 1941 morreu no Campo de Concentração de Auschwitz, na Polônia.

“O seu martírio foi um fato marcante. A exemplo de Cristo, ele entregou a sua vida para que o irmão a tivesse, um pai de família. Para mim, bastava esse fato de sua história para a gente saber que Maximiliano foi um grande seguidor de Jesus”, explicou.

O sacerdote também destacou a devoção do frei à Virgem Imaculada. “Ele era uma criança ativa, teimosa e muitas vezes desobediente; e sua mãe ficava preocupada. Um certo dia, ela o questiona: Raimundo, o que vai ser de você? Essa indagação mexe com o menino que muda repentinamente de comportamento. E mais tarde, relatado pela própria mãe de São Maximiliano, se descobre o porquê dessa mudança. É que naquele mesmo dia, o menino tem uma visão de Maria respondendo o questionamento, mostrando duas cores: uma branca, simbolizando a pureza, e outra vermelha, o martírio. Ele escolhe a duas. Ele viveu a pureza de Cristo e morreu como mártir”.

Padre Petrúcio Ramires recorda como o santo utilizou a comunicação como instrumento de evangelização. “Ele usa a boa imprensa com a revista Cavaleiro da Imaculada e através dessa publicação defende a fé, não brigando com os inimigos da Igreja, mas dando testemunho, levando amor aqueles que trazem a guerra, levando a paz para aqueles que promovem o ódio”.

A devoção ao santo polonês iniciada em 1986 passou por diversas gerações e perpétua entre os mais jovens da paróquia e expressam com orgulho, ter Padre Kolbe como seu padroeiro

“A força de vontade e a persistência que ele teve, mesmo com fome e cansaço, são bonitas. Ele nunca perdeu a fé e não deixou jamais de acreditar em Deus naquele momento de agonia no campo de concentração, contagiando seus companheiros de cela, fazendo com que eles seguissem o mesmo caminho, rezando até o último momento”, disse o coroinha Gabriel Santos.

Gabriel Santos é um dos devotos jovens do santo polonês (Foto: Reprodução)